Vale a pena investir em FIIs de papel? Fui atrás da resposta
Eu não sei você, mas sempre que eu leio sobre Fundos imobiliários (FII), eu nunca vejo muitos comentários sobre os tipos deles.
Evidente que todo mundo sabe que existem os fundos de papel e os fundos de tijolo.
Mas sempre que uma matéria cita FII no geral, é muito raro ouvir falar dessa distinção.
O que acaba sendo estranho porque o FII de papel não deveria ser comparado com um fundo de tijolo. A proporção paga em dividendos para os seus cotistas sempre vai ser diferente.
Bom, mas será que os fundos de papel são uma boa opção de investimento? O que é preciso analisar antes de investir?
Antes de mais nada, o que são FIIs de papel?
Os fundos imobiliários de papel diferente dos fundos de tijolo não possuem ativos físicos.
Eles são basicamente donos de outras cotas de outros FIIs ou utilizam seu patrimônio para financiar empreendimentos imobiliários.
No que os FIIs de papel costumam investir?
Eu não sei bem se o termo “investir” é o melhor para esse caso.
Isso acontece porque na verdade esses fundos estão emprestando dinheiro para outras empresas, quem geralmente faz o investimento é o cotista no fundo.
Bom, de acordo com a instrução da CVM Nº 472, os possíveis “papéis” para um FII investir são:
- Debêntures
- ações (atividades permitidas aos FII)
- FIDC (atividades permitidas aos FII)
- Cotas em outros FIIs
- CRI
- LCI
- LH
- LIG
O que acontece na prática?
Apesar de existirem várias opções, os FIIs de papel não costumam diversificar tanto assim.
Eu fui atrás de alguns dos maiores FIIs de papel para você ter uma ideia de como costuma ser o portfólio deles:
FII de papel | Valor de mercado | CRI | FIIs | Outros |
KNCR11 | R$ 3,84 bilhões | 92% | 0% | 8% |
KNIP11 | R$ 4,37 bilhões | 92,8% | 1,7% | 5,5% |
KNHY11 | R$ 1,15 bilhão | 92,1% | 2,6% | 5,3% |
HFOF11 | R$ 2,26 bilhões | 0% | 98% | 2% |
BCFF11 | R$ 1,85 bilhões | 0% | 93% | 7% |
HGCR11 | R$ 1,3 bilhão | 81,4% | 16,4% | 2,2% |
Na prática eles utilizam de CRIs ou investem em outros FIIs de tijolo.
Não é melhor eu comprar CRI sozinho(a)?
Essa é uma pergunta bem válida, mas existem alguns problemas na hora de se investir em CRIs sozinho(a).
O problema é que os CRIs não são como títulos públicos (Tesouro Direto).
Quando se fala de um fundo de investimento que compra Tesouro Direto, geralmente não existe uma vantagem clara para investir no fundo.
Isso acontece porque você pode comprar os mesmos títulos que o fundo de investimento compra.
Mas no caso de CRI, a chance de você não ter acesso aos mesmos papéis é grande.
As emissões de CRI costumam ser bem restritas e somente para investidores grandes ou qualificados.
Para você ter uma ideia melhor, verifique a lâmina de um FII de papel e veja as taxas que eles fecharam o CRI (todas as informações estão lá).
Por último, é só compará-las com as taxas de CRI que a sua corretora oferece.
FII de papel é melhor que FII de tijolo? O que avaliar?
Essa questão talvez não esteja tão relacionada ao conceito “qual é o melhor”.
A grande questão é saber o preço certo para cada um desses fundos imobiliários.
Eu peguei os 3 principais pontos que você precisa analisar antes de fazer esse investimento.
Vamos lá?
1-Margem dos FIIs de papel se assemelha às margens de bancos
Um dos principais pontos está na relação dos FII que “investem” em CRI versus os FIIs de tijolo (ou que investem em FIIs de tijolo).
O problema aqui é que os FIIs de papel basicamente funcionam como bancos emprestando dinheiro para empresas.
Mas e qual o problema dos FIIs de papel imitarem os bancos?
Bem, o Brasil sempre foi um país em crescimento e com altas taxas de juros (algo bom para os bancos), mas na Europa a gente viu isso se desalinhar.
Depois da crise de 2008 a economia da União Européia ficou estagnada e as taxas de juros basicamente zeraram.
Agora que entra o problema…
Para você ter uma ideia no impacto disso eu peguei o preço das ações dos principais bancos europeus para você o que aconteceu desde de 2008:
Como as margens de empréstimos diminuíram e consequentemente os dividendos pagos aos acionistas também, as ações acabaram tendo um impacto fortíssimo.
Agora imagina que os FIIs de papel, por “imitarem” um banco, tendem a ter um desempenho muito parecido com eles.
Logo, se o Brasil no futuro passar por uma estagnação como na Europa, é bem possível que esses fundos também tenham um desempenho ruim.
Ah! Vale lembrar que o Brasil sempre foi um país que teve altas taxas de crescimento, apesar das crises recentes.
Mas ninguém sabe o que vai acontecer no futuro…
Detalhe de exposição dessas margens
Antes que eu me esqueça…
Além de tudo isso, existe um outro possível problema caso você esteja investindo em FIIs de papel.
Se você, por exemplo, investe em ações de bancos, compra CDBs e investe em FIIs de papel é bem provável que a sua exposição em relação às margens de empréstimo seja muito alta.
Já pensou o quão impactado você será se as margens de empréstimo diminuírem no futuro como aconteceu na Europa?
2-FII de papel que investem em outros FIIs podem ter altas taxas de administração
Outro ponto importante é se o seu fundo de papel investe boa parte do patrimônio em um outro fundo de tijolo.
Você pode nem perceber de primeira, porque a maioria dos investidores de FII analisam somente o dividend yield na hora de investir.
Nesse caso, mesmo com taxas altas isso não deve afetar muito você, mas se por acaso você está fazendo esse investimento porque acha que o valor da sua cota irá subir, pense novamente.
Imagina ter que pagar duas taxas de administração? A taxa do seu fundo de papel mais a taxa do fundo que o seu fundo de papel investiu? Ficou até confusa a frase de tanta taxa que tem.
A chance de você sair ganhar no final das contas é bem difícil…
3-FIIs de papel não têm imóveis para serem valorizados
O último problema e talvez o mais impactante deles é a questão da valorização do imóvel.
Na verdade, está bem relacionada com o primeiro ponto que eu citei.
Só que ao invés dos fundos de papel perderem margem de crédito ao longo dos anos (estabilização da economia), aqui o problema é que eles não valorizam.
Um FII de tijolo tem o valor dos seus imóveis sempre ajustados pela inflação, mas o de papel não tem imóvel para valorizar.
Antigamente a FGV elaborava um índice para verificar quanto o imóvel valorizou e quanto ele gerou de renda ao longo dos anos.
Ela fazia uma média com vários setores de imóveis comerciais (logística, comercial, etc.) para chegar nessa resposta.
Uma pena que o índice foi abandonado há um tempo, mas eu consegui pegar alguns dados antigos para você ter uma ideia:
O que dá para ver aqui é aqui é que o retorno do capital (imóvel) foi basicamente igual ao da renda (aluguel).
Na verdade esse aumento igual ao da renda é basicamente a inflação, mas que ainda tem um impacto muito grande no seu retorno.
Mas como resolver essa questão? Reinvisto uma parte do dinheiro?
Bem, se fundos de papel só pagam o equivalente ao “aluguel”, você deveria exigir uma margem maior de dividend yield para combater a inflação.
Como o mercado já faz essa conta, você só precisa se lembrar de reinvestir a parte da inflação que você recebeu.
Isso acontece porque a Lei N° 8.668 exige que os FII repassem pelo menos 95% dos lucros:
O fundo deverá distribuir a seus quotistas, no mínimo, noventa e cinco por cento dos lucros auferidos, apurados segundo o regime de caixa, com base em balanço ou balancete semestral encerrado em 30 de junho e 31 de dezembro de cada ano.
Assim, mesmo que o seu FII de papel reinvista esses 5%, eles não serão suficientes para combater a inflação.
Eu fiz uma simulação para ver se esses 5% do lucro que os fundos podem reinvestir seria suficiente para cobrir a inflação, dê uma olhada:
Dividend yield pago aos cotista (DY) | Percentual do patrimônio reinvestido pelo FII baseado no DY (5% de retenção) |
6% | 0,3% |
10% | 0,5% |
15% | 0,75% |
Apesar dos FIIs poderem reeinvestir essa parte, ela está bem longe de cobrir a inflação dos últimos anos que tivemos no Brasil (gira em torno de 5% a 6%).
Afinal, investir em FII de papel é uma boa opção?
Particularmente não gosto de fundos de papel que investem em outros fundos, não consigo ver como eles podem ter um resultado positivo no longo prazo com altas taxas de administração.
Já em relação aos fundos de papel que investem em CRIs eu não tenho nada contra.
A única questão é você precisa pegar os 3 pontos que eu citei lá em cima e formular uma estratégia de investimento.
Quanto você acha que o fundo de papel precisa render mais por mês (dividend yield) do que o fundo de tijolo para ser interessante?
Eu não vou deixar uma fórmula para você aqui porque detesto esse tipo de coisa, mas acho que você tem informações suficientes para chegar em uma boa resposta agora!
Quer aprender mais sobre FIIs?
Se você gostou desse artigo que eu escrevi eu tenho certeza que você vai gostar de outros por aqui.
Você provavelmente percebeu que eu sempre uso muito conteúdo visual e comento sobre questões práticas para analisar um assunto.
Todos os meus artigos do blog são assim!
Eu muitas vezes chego a ler dois três livros só para escrever um único artigo.
Vou deixar alguns deles aqui embaixo para você dar uma olhada:
- Guia completo para os FIIs
- É melhor investir em FIIs ou em ações?
- Como avaliar fundos imobiliários de tijolo?
- Renda fixa ou renda variável, qual é a melhor?
Até mais!
Bom… agora sei q tijolo é algo palpável, papel não.
As *porcentagens da sua tabela ñ está tão clara pra mim, mesmo assim achei um artigo muito bom (expõe coisas q os youtubers não falam).
Quase ninguém fala de investimentos q tem rerendimento real acima da inflação. Pq ?
Oi, Marcelão.
Obrigado pelo elogio.
A ideia dos gráficos era mostrar que os FIIs de papel podem ter um rendimento menor no futuro se a margens dos empréstimos bancários reduzirem (como aconteceu na Europa).
Confesso que não gosto de ler conteúdos no Google de sites de bancos e corretoras porque eles possuem algumas “diretrizes” e muitas vezes os textos não são tão interessantes assim para o investidor comum.
Por sinal, esse foi um dos principais motivos de eu criar o meu site.
Abraço.